segunda-feira, 19 de setembro de 2011

o dia 17 de Setembro

Hoje faz um ano desde que fiquei órfão em Milão. Calhou num domingo, belo dia para sermos despejados de uma carrinha e deixados à nossa sorte no meio das paredes até então brancamente hostis da residência cujo nome lembrava um acampamento de escuteiros com pouca imaginação, Campus Certosa. À minha frente, depois de todo um chão vazio e cimentado com grades de ventilação e pessoas pobres a vaguear, reinava o maior supermercado que até então tinha visto nas redondezas. E o mais inútil, portanto. Deveria ser crime largar um filho à sua sorte num domingo.
Ora, entrando eu pelas portas sumptuosamente automáticas da residência, decido fazer o que qualquer pessoa em Itália faria num situação de tal precaridade alimentícia: encomendar uma pizza. Dirijo-me então à recepção com o melhor dos meus sorrisos recém-desemparelhados e começo a falar no meu melhor inglês, também recém-desemparelhado. O recepcionista tentava esforçadamente fazer-se entender na sua extensa explicação do menú da call-on pizzaria mais próxima, mas eu não estava a conseguir compreender o que raio seria um zucchine. Quando o solícito Giovanni se resolve por fim a acabar com a penosa dúvida, virando para mim o monitor do computador e mostrando toda uma página cheia de courgettes verdes, compridas e grossas, percebi que a saga "Awkward Moments do Gonçalo" seria uma espécie de "Anjo Selvagem" italiano, aparentemente sem fim à vista.

E depois, a sinopse do fail dessa mesma tarde: "Gonçalo decide seguir as indicações de dois italianos bastante idosos e apanha mil autocarros com destino a um outro supermercado que supostamente abriria aos domingos. Gonçalo volta para casa através de bairros suburbanos e consegue chegar a paragem do autocarro através da ajuda de um senhor que fez questão de percorrer quilómetros para o deixar na paragem certa e depois voltar para trás. O mais surpreendente: Gonçalo regressa ainda virgem à residência, e, para sua felicidade, volta a comer pizza ao jantar."

Um ano depois, percebe o quão ingrato é em olhar com tristeza para o seu prato de dois croquetes e batatas um-nadinha-fritas da cantina. É óbvio que uma pessoa nunca aprende.

3 comentários:

  1. sim, eu ri-me que nem uma criancinha idiota quando ouve a palavra "cocó" ao ler "verdes, compridas e grossas". I see what you did there.

    e: oh, a comida enganosa da cantina, que saudades que eu não vou ter disso.

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  2. Ele fez de propósito, throwing in that "grossas" :P

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  3. tenho saudades da comida enganosa da cantina.

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